quinta-feira, 17 de março de 2011

O milagre da música

Sexta-feira, final da tarde, no conservatório tem início mais uma audição de classe de piano.
O tempo ali pára. E o espaço transforma-se num oásis de quietude que nos proporciona uma paz espiritual, bem longe do reboliço que, àquela hora, se vive na cidade.
Os dois filhos integram a lista dos alunos que se perfilam para prestar provas.
Os pais estão mais nervosos que os prórios "rebentos".
O desfile começa. As intervenções, todas sem excepção, são seguidas pelos progenitores e familiares com a máxima atenção. Os aplausos, que ali nunca se regateiam, servem, por vezes, para camuflar a enorme camada de nervos que se vai avolumando, à medida que cada pai vê aproximar-se a vez do seu filhote. Foi sempre assim. Por mais que se lute contra o nervosismo, de nada vale.
O primeiro, 22º da lista [de entre trinta e seis alunos de todos os níveis] entra em campo. O progenitor liga a câmara improvisada do telemóvel. O som cristalino ecoa na sala. "Invenção nº 15, em Si Menor" de Bach; impecável actuação e, no final, uma grande salva de palmas.
Meia hora depois, o mais velho, 34º, entra em cena. Os primeiros acordes ecoam na sala. "Clair de la lune", sonata op. 27 nº 2 - 1º andamento, de Beethoven. A timidez inicial rapidamente dá lugar a uma fluente interpretação que tira do piano um belíssimo som.
A música inunda o auditório e invade-nos a alma. A emoção do momento toma conta da plateia. Num ápice, surge uma corrente invisível que nos prende uns aos aos outros, inebriados pela beleza que só a música pode proporcionar.
Piano, intérprete e plateia, em perfeita sintonia, de tal modo unidos que parecem uma coisa só! Que são uma coisa só!
Até os nervos com o receio de alguma nota mal tocada desaparecem e dão lugar a uma explosão de alegria interior.
A actuação chega ao fim e é muito aplaudida.
Uma mãe dizia no final: "tocou-me... tive que fazer força para aguentar... e não ir abaixo!"
Histórica audição! Um milagre, só ao alcance da Música!

7 comentários:

  1. Senti-me transportada para uns anos atrás quando com orgulho e nervoseira observa-a o filhote sentado ao piano dando a sua primeira audição. Tinha (e tem) dedos de pianista, dizia a professora...quando os acordes ecoavam pela sala senti-a uma emoção profunda. Aos 13 anos achou que já era muito crescido e o piano era para "betos"...mas algo ficou, por vezes os acordes ecoam pela casa e aquele som atinge-me da mesma maneira! acho que a música torna as pessoas mais unidas e sensivéis.
    Bjs

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  2. Pareceu-me viver esses momentos únicos. Os pais estão sempre pendentes dos gestos dos filhos, ainda mais quando em palco. Como o sei!

    Beijos

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  3. A descrição perfeita de uma audição musical!

    O ambiente de nervosismo que se vive no silêncio da espera, num crescendo urgente, quase explode no momento em que nos sentamos ao piano.
    E tocadas as primeiras notas, ainda debaixo de grande tensão, eis que de repente, a música nos vai invadindo, e tudo toma seu lugar!
    O prazer de percorrer o teclado (naqueles primeiros momentos parece dobrar-se em múltiplas extensões) deixa-nos fluir em íntimo diálogo! E a musicalidade faz-se...
    Lugares privilegiados!

    Como (re)lembro as peças aqui identificadas!

    Talvez, não acredite, mas há anos que não abro o piano...
    :(

    Uma boa semana de trabalho!
    Um beijo,

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  4. Só a música é capaz de produzir em nós esse estado de alma...a música, a boa música é realmente a mais bela das artes,por ser a mais rápida...é como um letal veneno...actua com precisão...e tem um efeito espantoso...
    Eu teria gostado de aprender a tocar piano...esse desejo permanece ainda hoje em mim...provavelmente nem tenho queda nenhuma...nem veia ...mas...
    Boa semana. Boa Páscoa
    Bjs

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  5. Imagino o turbilhão de emoções...

    adoro música!
    Bjs

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  6. Fizeste-me recuar alguns anos na minha vida. No final de cada período também me preparava para assistir às audições do meu filho no Conservatório.Arrepiada,deixava cair as lágrimas perante o desempenho aprumado do rapaz. Ainda hoje , toca piano todos os dias depois de muitas horas de trabalho intenso. É a melhor terapia para o stress acumulado.
    Bem-hajas!

    Beijinho

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  7. E só a escrita nos devolve esse milagre.

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