domingo, 6 de dezembro de 2015

Aquilino disse um dia

"Há duas coisas péssimas que podem acontecer na vida de cada um de nós: uma é a satisfação ou realização de todos os projectos e sonhos; outra é a frustação de todos os projectos e sonhos" - cito, de cor, Fernando Dacosta, ontem à noite, na Conversa com mote de Aquilino Ribeiro "Só as ânsias valem porque os triunfos, esses, acabam em bocejos", TINTO no BRANCO" Festival Literário de Viseu

domingo, 9 de agosto de 2015

HATHERLY


A CASA DE BEETHOVEN

A casa onde nasceu Beethoven
Tem quatro pisos
Mas é pequena e triste:
Em 1999
Está cansada.
 
O soalho range perigosamente
Quando passam os turistas
Que caminham lentos
Um tanto receosos.

A um canto
Dois pianos da época
Encostam suas caudas
Timidamente
Temerosos de algum
Não desejado contacto.

Em todos os andares
Nas paredes
Há velhos retratos
E em vitrines
Algumas velhas partituras
Jazem sonolentas.

Fazendo pendant
Com os aparelhos de ouvir
Estão as lunetas embaciadas
Do Mestre.

A casa está vazia
Porque o Mestre
Não está.
Só no jardim
Paira ainda
No leve murmúrio da folhagem
Uma inaudível voz
Um som longínquo
Que ressoa dentro

 ANA HATHERLY, In “Divina Música”, Antologia de Poesia sobre Música
Edição da PROVISEU

 
Morreu AH
Sobre ela, Mário Galego, na Antena 1 disse:
"Escrevia versos que se transformavam em desenhos e desenhava como quem escrevia…


Singela homenagem, na sua viagem sem regresso [5 Ago, 2015]:

sexta-feira, 5 de junho de 2015

metáforas


“(…) querem tornar-nos consumidores passivos!

(…) no ensino de hoje não é preciso decifrar metáforas
ou conhecer um vocabulário alargado
basta saber ler um anúncio.
*
MÁRIO DE CARVALHO
momento em que lembra 
O varandim seguido de Ocaso em Carvangel.

domingo, 15 de fevereiro de 2015

CAMÕES


Camões nasceu do Canto que o criou
converteu-se na poesia que escreveu
na corrente melodiosa que amanheceu em si
de um jogo de harmonia de ondas e de asas
e de uma formosura descalça seminua como Vénus
apenas com um cendal branco sobre a coroa carnal
 
O génio de Camões conhecia as centelhas de ouro
que reunia em flores de harmonia
os lábios de chamas dilacerantes
Ele cantou com as mãos em sangue
e com lágrimas de asas feridas
a maravilha fatal da vida
da luminosa música
de um amor perdido de uma saudade inextinguível
 
Cantou a pátria, a pátria do seu povo e do seu peito
dos navegadores e dos amantes em palavras
de melodiosa audácia de uma nostalgia pura
Dilacerante e doce era o incêndio do seu amor
de acorde deliciosos de claras mágoas
em que a ferida de amor se transmudava
e se elevava num grito redondo numa neblina azul
 
O seu amor era um claro incêndio de lágrimas e de chamas
e sempre um canto e sempre a dor
como se a música e o pranto jorrassem da mesma fonte
e os contrários se unissem na identidade da água
em que o poema se converte numa melodia de
ondas radiosas
de elementos puros duma elegia no aroma de
dilacerante doçura
 
Camões está vivo não por um prestígio dourado
mas pelo claro fogo que deu uma vida nova à Língua
Portuguesa
e nunca recusou à dor o direito de viver como um grito
e de a converter sem a trair sem a desfigurar
mediante a transcendência da sua ascensão humana
 

ANTÓNIO RAMOS ROSA
in "Os signos da amizade"
em tarde de Inverno